terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

NOVO ACESSO À FAJÃ DO CALHAU SÓ A FAVOR DE ALGUNS



(fotos de António Lopes)

NOVO ACESSO À FAJÃ DO CALHAU SÓ A FAVOR DE ALGUNS : Chocados com a obra
03 Fevereiro 2009 [Regional]

A Autoridade marítima, nos Açores, foi ignorada pelo governo. Associações ecológicas mantidas à margem. Não há decisão do conselho do governo. Desconhece-se parecer do Laboratório Regional de Engenharia Civil. Não há estudo de impacto ambiental (mesmo não sendo obrigatório). E quase todos estão a duvidar da exisência de projecto. O processo do novo acesso à Fajã do Calhau que os deputados do Parlamento dos Açores vão investigar, durante 45 dias, está eivado de múltiplas dúvidas que o governo fugiu sempre a esclarecer devidamente.

O processo das obras de acesso à Fajã do Calhau, entre Água Retorta e o Faial da Terra, revela, em toda a sua dimensão “um quero, posso e mando nunca visto nos Açores”. Uma investigação do «Correio dos Açores» mostra que, apesar de parte da decapitação da ravina estar dentro do domínio público marítimo e estender-se mesmo até à linha de água, a capitania do Porto de Ponta Delgada não foi informada das obras. Agentes da Polícia Marítima estiveram no local e elaboraram um auto que enviaram, com fotos e uma notícia da Euronews, em Julho de 2007, à direcção regional de Ordenamento do Território e Recursos Hídricos. A capitania do porto estava a elucidar o infractor de que estava a actuar à margem da autoridade marítima. Contrariando a expectativa criada no Departamento Marítimo dos Açores, este ofício não mereceu resposta. A capitania foi, assim, ignorada neste processo.
O actual capitão do porto, Comandante Carlos Augusto Castro Garcia, não esconde que teria sido razoável o governo dos Açores elucidar a polícia marítima sobre a obra. Mas o facto é que isso não aconteceu.
Uma equipa de reportagem esteve na frente de mar da obra que se desenvolve até à linha de água onde, provavelmente, os deputados da comissão parlamentar do Ambiente e Trabalho não vão chegar. O movimento de terra e pedras é colossal. Com o rebentamento da ravina, desapareceram faias, urzes (nativas) e incenso que é um infestante, mas que é útil na cultura do ananás e como sebe. E também se vê a cana, considerada infestante mas que foi usada como sebe e como suporte das vinhas em algumas localidades da ilha de São Miguel, sobretudo na costa Sul.
Pela primeira vez a associação ecológica “Amigos dos Açores”, na voz do seu novo presidente, Diogo Caetano, vem a público, através do «Correio dos Açores», para sublinhar a gravidade do “grande impacto ambiental” da obra.
Relevante para o esclarecimento de todo este processo que o governo tornasse público o parecer do Laboratório Regional de Engenharia Civil, já que, apesar dos esforços de organizações ecológicas, nunca o fez até agora.
A Quercus está em processo de renovação nos Açores. O seu actual responsável, Barreiro Gomes, não tem dúvidas. A obra de acesso à Fajã do Calhau “é das coisas mais graves que, a nível ambiental, se fez nos últimos tempos nos Açores. Aquilo não se compreende. É uma coisa fora de qualquer realidade. A nossa organização (Quercus) ficou chocada e manifestou-se na devida altura para que a obra não continuasse”.
Quando questionado sobre se existe alguma possibilidade de o governo emendar a mão, Barreiro Gomes responde que “a natureza é sempre muito lenta a recompor qualquer intervenção que se faça. Talvez daqui a umas dezenas de anos…”.
A investigação do «Correio dos Açores» vai fazer caminho. À primeira vista, choca a relação custo/benefício da obra. Custos não só de investimento como em termos de impacto ambiental para a população que passa o verão na Fajã. Quem ganha, na realidade, com o facto de os terrenos irem triplicar de preço? É esta a dimensão da próxima reportagem.

Autor: João Paz

Reportagem extraída do jornal Correio dos Açores