domingo, 3 de janeiro de 2010

A Incineração de resíduos volta à ordem do dia


No dia em que o novo presidente da AMISM volta a defender a queima de resíduos sólidos urbanos, abaixo apresentamos um texto sobre o assunto.

Recorde-se que a queima de resíduos era uma pretenção do ex-presidente da AMISM (PSD) que teve a forte oposição do Governo Regional dos Açores (PS).

Neste momento, tanto o Governo Regional como o presidente da AMISM são da mesma cor partidária, portanto o que não era péssimo ontem pode ser formidável hoje.

Além disso, ao movimento ambiental nos Açores falta uma voz que sempre se levantou contra a chamada valorização energética: Veríssimo Borges.




A INCINERAÇÃO DE RESÍDUOS:
uma tecnologia a desaparecer


Adaptado de um Relatório elaborado pela Aliança Global de Alternativas às Incineradoras


Sumário

As incineradoras são um método obsoleto e insustentável de lidar com os resíduos. À medida que a oposição global à incineração continua a crescer, estão a ser desenvolvidas e adoptadas em todo o mundo filosofias e práticas inovadoras para uma gestão sustentável de resíduos.

Secção 1: Os problemas da incineração

A secção 1 lida com os problemas da Incineração de Resíduos: descargas de poluentes, tanto para o ar como para outros meios; custos económicos e custos de emprego, perda de energia, insustentabilidade e incompatibilidade com outros sistemas para a gestão de resíduos. Também lida com os problemas específicos dos países do Sul.

As dioxinas são os principais poluentes associados às incineradoras. Estas são os causadoras de uma grande variedade de problemas de saúde que incluem o cancro, danos no sistema imunitário, problemas reprodutivos e de desenvolvimento. Esta tecnologia é a principal fonte de dioxinas a nível mundial.

As incineradoras são a maior fonte de poluição por mercúrio, sendo a sua contaminação de vasto alcance, prejudicando tanto as funções motoras, sensoriais como cognitivas. São também uma fonte significativa de poluição por metais pesados tais como o chumbo, cádmio, arsénico, crómio e berílio.

Outros poluentes que causam preocupação incluem hidrocarbonetos halogénicos, gases ácidos, que são percursores da chuva ácida; partículas que prejudicam as funções pulmonares e gases que provocam o efeito de estufa. Contudo, a caracterização das descargas de poluentes das incineradoras ainda está incompleta; existem nas emissões gasosas e nas cinzas muitos componentes não identificados.

Os operadores das incineradoras afirmam várias vezes que as emissões estão sob controle, mas as evidências indicam que este não é o caso.

A Incineração de Resíduos: Uma Tecnologia a Desaparecer, porquê?

Primeiro, para muitos poluentes, tais como as dioxinas, qualquer emissão adicional é inaceitável; segundo, a verificação das emissões é irregular e bastante imperfeita, deste modo não são verdadeiramente conhecidos os actuais níveis de emissões; terceiro, a informação existente indica que as actuais incineradoras são incapazes de satisfazer o actual padrão regulamentar.

Quando o equipamento para o controle de poluição funciona, remove os poluentes do ar, concentrando os nas cinzas soltas, criando um fluxo perigoso de resíduos tóxicos, que necessita de um tratamento adicional. Deste modo o problema da libertação de poluentes não está resolvido; os poluentes são simplesmente transferidos de um meio (ar) para outro (sólido ou água). As cinzas libertadas pelas incineradoras são bastante perigosas e são muitas vezes mal reguladas. Nem mesmo os aterros sanitários são seguros, porque deixam passar substâncias perigosas; em alguns lugares, as cinzas estão expostas ao ambiente ou até espalham se por áreas residenciais ou áreas de produção alimentar.

As incineradora estão, muitas vezes, situadas em redor de populações minoritárias, de baixo rendimento, com a alegação de que estes sectores da população, politicamente fracos, serão menos capazes de resistir lhes. Isto é uma violação dos princípios básicos da justiça ambiental.

As incineradoras modernas são, de longe, a abordagem mais dispendiosa para a gestão de resíduos, só os custos da sua construção podem chegar a centenas de milhões de dólares americanos. Os custos do edifício e do funcionamento da incineradora são, inevitavelmente, suportados pelo público. As empresas que disponibilizam as incineradoras têm inventado vários esquemas complicados de financiamento, para conseguirem o apoio do governo, em pagamentos a longo prazo, o que várias vezes provou ser desastroso para os governos locais. Muitas cidades, nos Estados Unidos, endi¬vidaram se devido às suas incineradoras.

As incineradoras criam, de longe, menos empregos por tonelada de resíduos do que as tecnologias alternativas e práticas, como a reciclagem. Geralmente, também, substituem o trabalho em rede de reciclagem informal, já existente, causando dificuldades adicionais ao mais pobre dos pobres.

Esta tecnologia é, muitas vezes, conhecida como produtora de Energia, visto poder produzir electricidade. No entanto, uma análise detalhada do ciclo de actividade revela que as incineradoras gastam mais energia do que produzem. Isto porque os produtos, que são incinerados, deverão ser substituídos por novos produtos. Extraindo e processando materiais virgens, transformando os em novos produtos, gasta-se muito mais Energia (causando também mais danos ao ambiente) do que produzir materiais reciclados.

A maior parte da história da Incineração de Resíduos passa-se nos países do Norte. Os contextos dos países do Sul são capazes de ser ainda mais problemáticos para a implementação desta tecnologia. A falta de capacidade de monitorizar, significa que as incineradoras a introduzir no Sul são capazes de ser ainda mais poluidoras do que aquelas já existentes no Norte. Problemas administrativos, tais como orçamentos incertos e a corrupção, podem interferir com a manutenção necessária. As diferentes condições físicas, como o tempo, e as características dos Resíduos podem tornar as operações de controle difíceis ou até mesmo impossíveis.

Finalmente, deve ser entendido que as incineradoras são incompatíveis com outras formas de gestão de Resíduos.Com efeito a incineração subestima a ética de separação na fonte.


Incineração de Resíduos: Uma Tecnologia a Desaparecer Porquê?

Secção 2: Alternativas

A secção 2 apresenta algumas alternativas à Incineração. Os aterros sanitários não são uma alternativa viável, visto serem insustentáveis e problemáticos para o ambiente. As alternativas devem atacar, de preferência, a noção completa da deposição de Resíduos, reciclando todos os materiais descartáveis, processo muito favorável para a economia do Homem ou mesmo para a Natureza, atenuando, deste modo, a pressão sobre os recursos naturais.

Em vez de se assumir que a sociedade produzirá uma quantidade de Resíduos cada vez maior, deve se dar prioridade à redução dos resíduos. Estes devem ser separados, para que cada fracção possa ser transformada em adubo ou reciclada, em vez do actual sistema de despejo de resíduos misturados. As indústrias também poderão voltar a “desenhar” os seus produtos para facilitar a reciclagem.

A não selecção dos Resíduos municipais destrói muito do seu valor. Os Resíduos orgânicos contaminam os Resíduos recicláveis e os tóxicos destroem a utilidade de ambos.

Os programas para a gestão de resíduos municipais devem estar adaptados às condições locais para terem sucesso. Particularmente, os programas do Sul não devem seguir exactamente o modelo dos do Norte, porque existem diferenças nas condições físicas, económicas, legais e culturais. Especialmente no Sul, o sector informal (lixeiros ou varredores de ruas) são componentes significativos de um sistema para o tratamento do lixo já existente e o melhoramento das suas condições de trabalho deve ser uma componente central de qualquer sistema municipal para a gestão de Resíduos. Um exemplo de grande sucesso é o do Zabbaleen, do Cairo, onde organizaram, por si próprios, um sistema de recolha e reciclagem de lixo que desvia 85% do lixo recolhido e, concomitantemente, emprega 40.000 pessoas.

Geralmente no Norte e no Sul os sistemas para a gestão de Resíduos orgânicos são os componentes mais importantes de um sistema municipal para gestão do lixo. Os Resíduos orgânicos deviam ser transformados em adubo, vermiadubo ou servir de alimento para animais, reconduzindo, assim, para o solo, os seus nutrientes. Isto também assegura uma corrente de produtos recicláveis não contaminados. Por seu lado, a reciclagem cria mais empregos por tonelada de lixo do que qualquer outra actividade, produzindo uma variedade de materiais que pode servir de matéria prima para a indústria.

No entanto, a maior barreira para a reciclagem, neste momento, é o facto da maioria dos produtos não serem feitos para serem reciclados, no final do seu tempo de uso. A Responsabilidade Alargada do Produtor é uma política de abordagem que requer que os produtores levem de volta os seus produtos e embalagens. Isto dá lhes a iniciativa necessária para que voltem a “desenhar” os seus produtos com tempo de uso, recicláveis e sem materiais perigosos

Por um lado, banindo o uso de determinados produtos e, por outro, obrigando as indústrias a procederem a alterações nos produtos que fabricam e, ainda, a procedendo à sua transformação em adubo e à sua reciclagem, é possívelafastar a maior parte do lixo municipal, para longe dos aterros sanitários e da incineração. Muitas comunidades têm alcançado taxas de desvio de 50% e até valores mais elevados, com o intuito de alcançar o estatuto de Lixo Zero.

Os centros de saúde e hospitais são uma fonte de uma quantidade significativa de Resíduos. É essencial um sistema rigoroso para a separação do lixo, para que a pequena percentagem de resíduos potencialmente infecciosos ou químicos perigosos fiquem separados dos resíduos gerais.

Os Resíduos potencialmente infecciosos necessitam de tratamento e despejo. Para a sua desinfecção, estão disponíveis várias tecnologias. Estas, geralmente não são dispendiosas, são tecnicamente menos complicadas e menos poluidoras do que as incineradoras.

Nestes mesmos locais (hospitais e centros de saúde), são produzidos, em pequenas quantidades, uma grande variedade de resíduos químicos perigosos, incluindo produtos farmacêuticos. Alguns, tal como o mercúrio, deviam ser eliminados através de mudanças na sua aquisição; outros podem ser reciclados e o restante deve ser cuidadosamente recuperado e devolvido ao fabricante. Casos estudados mostram como estes princípios resultam em ambientes bastante variados, tais como numa pequena clínica de maternidade, na Índia, e num grande hospital urbano nos Estados Unidos.

Os Resíduos industriais não têm a tendência de ser tão variados como os Resíduos hospitalares ou municipais, mas muitos destes são quimicamente perigosos (tóxicos). A Produção Limpa é uma nova abordagem à indústria, que, procura eliminar produtos secundários tóxicos (perigosos), reduzir totalmente a poluição, criar produtos e subsequentes resíduos que sejam seguros dentro dos ciclos ecológicos.

Os Princípios da Produção Limpa são:

Princípio da Precaução, o qual invoca a precaução face a uma incerteza científica;

Princípio da Prevenção, que diz que é melhor prevenir o mal do que remediá lo;
Principio da Democracia, que diz que todos afectados por uma decisão têm o direito de participar na sua resolução;

Princípio Holístico, que requer uma abordagem integrada para a tomada de decisões referentes a questões ambientais.

Para a implementação da "Produção Limpa" estão a ser empregues uma variedade de instrumentos, como medidas políticas tais como o direito à informação, a reforma dos impostos e o apoio das Nações Unidas às empresas que implementam a Produção Limpa.

A Produção Limpa não pode responder ao problema dos Resíduos perigosos já existentes, amontoados ou armazenados, os quais necessitam de alguma forma de tratamento. Alguns programas estão a desenvolver tecnologias destinadas a solucionar este problema. Os padrões estabelecidos para estas tecnologias são
- alta eficiência destrutiva;
- controle de todos os produtos tóxicos;
- identificação de todos os produtos tóxicos;
- não ocorrência de emissões descontroladas.


Secção 3: Apagar as Chamas

A Secção 3 discute a crescente rejeição à incineração por todo o globo. A oposição pública tem rejeitado muitas incineradoras propostas e já existentes e tem sido incorporada nas leis locais, nacionais e até internacionais. A resistência popular às incineradoras é global; centenas de organizações de interesse público, em vários países, estão empreendidas na luta contra a incineração e a favor de alternativas.

Nos Estados Unidos, interesses económicos e a notória crise dos aterros sanitários, em 1980, levou a um aumento súbito da construção de incineradoras. Mas este aumento súbito gerou um massivo movimento de base, que anulou mais de 300 propostas para incineradoras municipais de resíduos urbanos. Os activistas lutaram por padrões de controle mais elevados nas emissões e na remoção de resíduos, o que, praticamente, provocou o fecho da indústria incineradora, no final do ano de 1990.

No Japão, o país do mundo onde é mais intensa a luta contra as incineradoras, a resistência à incineração é quase unânime, com centenas de grupos anti dioxinas, operando em todo o país. Nos últimos anos, a pressão pública levou ao encerramento de mais de 500 incineradoras..

Na Europa, a resistência tem sido feita com a implementação de alternativas. Mesmo com o aumento da população, em algumas áreas a produção de resíduos tem diminuído. Como resultado, na Europa, há pouco mercado para novas incineradoras.

Em Moçambique, os cidadãos organizaram se, superando diferenças de classe ou de cor, e formaram a primeira organização indígena ambientalista do país. A organização teve êxito na anulação da proposta para a incineração de pesticidas numa fábrica de cimento, situada na vizinhança de uma área residencial.

Noutros locais, os activistas tiveram de recorrer aos protestos e à acção directa para parar com a incineração. No entanto, a oposição pública tem vindo a ser cada vez mais manifesta através da Lei. Em 15 países, a jurisdição passou a proibir parcialmente a incineração e nas Filipinas a incineração foi totalmente banida.


Elaborado por Neil Tangri

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